Stuntman Mike: Ladies, we're gonna have some fun.
Antes de comentar o meu primeiro gosto da experiência "Grindhouse", devo admitir que o projecto de Tarantino não seria aquele em que teria mais expectativas. O conceito inicial de um "serial killer" que ataca jovens raparigas "indefesas" munido de um carro "à prova de morte" não me parecia aliciante o suficiente para despertar o meu interesse. Paralelamente a isso, os comentários de Tarantino, admitindo que neste filme teria escrito dos melhores diálogos da sua carreira parecia-me mais "fogo de vista", num marketing a roçar o desespero... Como eu estava enganado!...
Tarantino consegue em "Death Proof" apresentar-nos um projecto diferente, e com uma capacidade de envolvimento do espectador, de um modo tão inesperado, que certas cenas são como um murro directo no estomâgo, criando pena, gozo, alegria, e raiva... Nunca tive uma experiência numa sala de cinema onde me apetecesse gritar em plenos pulmões, como se falasse com as personagens femininas, incentivando-as a retaliar contra aquele homem tão perigoso como patético... É certo que terá sido a minha primeira experiência, mas isto é de facto o que esperava por "uma sessão Grindhouse"!
O mais divertido de Tarantino é a sua cultura cinematográfica, denotada em várias referências a filmes específicos, e a estilos marginais que este projecto procura revitalizar. Numa "reciclagem" que nunca recusa as suas características principais, vemo-nos a ver um filme que poderia ter sido filmado nos anos 70, início dos anos 80, mas num contexto actual, cheio de telemóveis e carros modernos, que contrastam com o estilo "cool" de pequenas preciosidades, como o Chevy Nova de 1970 ou o Dodge Charger de 1969 que "Stuntman Mike" conduz...
Um dos grandes trunfos, como Tarantino já nos habituou, é a sua banda sonora, que ora num toque carregado, ora algo melodico, enaltecem todo o ambiente da cena que presenciamos...
Mas realmente o maior trunfo desta película são as suas protagonistas... Ser mulher e é entrar num filme de Tarantino é quase equivalente do que entrar num projecto de Almodóvar!... Embora Tarantino goste mais da imagem "sexy mamma", as suas actrizes têm uma densidade e diálogos que é raro de encontrar. Death Proof é um pleno exemplo disso. Nele surgem alguns grupos de amigas, que têm conversas naturais, honestas e abertas, aparentemente banais, mas que reproduzem a imagem de muitas mulheres que conhecemos. Curiosamente, Tarantino vai contra o esteriótipo e apresentam-nos um conjunto de heroínas inesperadas, muito para a nossa surpresa!...
Do grupo, as mais conhecidas, das quais se incluem Rosario Dawson, Rose McGowan e Mary Elizabeth Winstead, cumprem a sua função na trama, embora tenham um perfil mais "secundário" do que as restantes. Inesperadamente, são Vanessa Ferlito, Tracie Thoms, Zoe Bell e Sydney Tamiia Poitier que nos enchem as medidas, e que envolvem o espectador num frenesim partilhado, em busca de uma solução que salve as moçoilas de morte certa.
Quanto a Kurt Russell, há muito tempo que não o viamos em tão boa forma, e tão disposto a gozar com a sua imagem, num personagem que faz lembrar um Snake Plissken ("Fuga de Nova Iorque") em tons de negativo... Russell é competente, e apesar de notarmos que leva a sério esta oportunidade, certo é que não se leva demasiado a sério, fundindo-se no projecto, e contribuindo para resultado final positivo.
"Death Proof" é um bom exemplo da competência de Tarantino, que de planos e montagens aparentemente descuidadas consegue conferir coerência num projecto que é mais do que um modo de entretenimento, é uma experiência viva que nos estimula, numa expectativa de que "Grindhouse" ainda "tenha bastantes cartuchos" para o futuro!...
Excelente
5 Estrelas