Viciado em Cinema e TV (A Sequela) por Nuno Cargaleiro

Julho 04 2008

 

Belén Rueda é conhecida na televisão espanhola pelas suas participações em “7 Vidas”, “Los Serranos” e “Perioditas”, já adaptados pela televisão portuguesa. Internacionalmente, destacou-se em 2004 como Julia em “Mar Adentro”, filme espanhol sensação desse ano. Em “O Orfanato” é Laura, a figura central de um enredo que mistura sobrenatural com obsessão, num argumento simples e inteligente que motivou a sua escolha como representante espanhol para o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro. Não mereceu a honra da nomeação, mas ninguém lhe retira os 30 prémios já atribuídos!

Laura regressa ao lugar onde passou grande parte da sua infância, até ser adoptada. Num casarão remoto num ambiente campestre do norte de Espanha, vive o espírito das lembranças daquele lugar e deseja retribuir em vida, criando um espaço para crianças com necessidades especiais. Com ela, traz a bagagem emocional, o marido, e o pequeno filho (Simón), que padece de uma doença misteriosa que desconhece, mas que não deixa de se abalar e ser a figura própria de um miúdo de tenra idade.

Pouco a pouco, a imaginação de Simón apresenta traços cada vez mais inquietantes, na medida que começa a descrever uma figura “invisível” que tem ramificações com o passado de Laura e daquele local. A culminação acontecerá no dia de apresentação do projecto do novo “Orfanato”, em que Simón desaparece, e Laura começa a perceber um comportamento estranho presente na casa que habita.

A realização é de Juan Antonio Bayona, argumento de Sergio G. Sánchez, mas a produção é de Guillermo del Toro. Curiosamente, nota-se a identidade de Guillermo del Toro neste projecto, que apesar de não apresentar o fascínio visual a que nos habituou, retrata um ambiente onde o sobrenatural e a realidade percorrem em paralelo por entre o enredo. Todo o argumento permite diversas perspectivas, desde as mais crentes às mais apreciadoras de realismo, sem que com isso perca coerência e impacto para o espectador.

Como a cena inicial do filme, “Orfanato” é um filme sobre fé e amor, onde a figura de Belén Rueda é o cerne e motivadora de avanço na história. Será através da sua luta em encontrar o seu filho que viveremos toda a mágoa e obsessão que este representa. Nesta perspectiva, este projecto demonstra-nos o que um filme de terror deve ser: simples, sem obrigatoriedade de “gore”, inesperado, contudo com uma narrativa humana e realista. Só assim é que o impacto nos pode assustar. E embora possa não ser uma força que nos faça saltar da cadeira, a amargura que surgirá inesperadamente levará o espectador a um horror mais identificável ao seu dia à dia, e consequentemente mais presente e assustador.

Num filme de actores e de bons diálogos, “Orfanato” não fica nada a dever a outros projectos de valor de “nuestros hermanos”, sendo um representante digno da qualidade cinematográfica que se faz para além da fronteira. Posto isto, quase dá para perguntar se Espanha não nos quer invadir! Nem que seja para conseguirmos fazer algo idêntico!

 

Muito Bom

4 Estrelas

publicado por Nuno Cargaleiro às 13:34
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Abril 06 2008


“Halloween” estreia em Portugal 30 anos após a sua criação. Filme de 1978, de um John Carpenter em ascensão, após a realização de “O Assalto à 13ª Esquadra”, teve um papel marcante na evolução do cinema de terror.

De estilo simples e inquietante, com influências da obra de Hitchcock, originalmente “Halloween” apostava num estilo escuro, onde a tensão e a iminência de qualquer ataque surgia a cada esquila. Michael Meyers, o psicopata homicida, reunia características entre o sobrenatural, como se tratasse de um monstro que vive em pesadelos, os quais encarnou numa figura sobre-humana.

Nessa altura, ainda não se falava em clichés e em lugares feitos, onde já saberíamos a cinco minutos do início do filme quem sobreviveria ou seria feito carne para canhão, cada uma vítima com uma morte mais horrível do que a outra. Essa fase terá surgido depois, nos projectos que seguiram, desde os anos 70 até aos dias de hoje.

Neste remake, o mais curioso e positivo terá passado pela escolha do realizador, Rob Zombie. Essa decisão reflectiu-se no argumento e no desenrolar do enredo, mais preocupado com a proximidade à realidade e à violência gráfica, tanto como a emocional. Talvez não seja o mesmo filme de silêncios, onde só ouvia um acorde de piano, composto por Carpenter, que brilhantemente atiçava os níveis de ansiedade dos espectadores. Aqui, já sabemos quem sobreviverá, e o objectivo terá sido orientado para uma centralização na figura do “monstro”, Michael Meyers, desde a sua infância até ao seu regresso, na perseguição incessante pela sua irmã mais nova Laurie. Rob Zombie reconhece que nos dias de hoje, o espectador de filmes de terror é alguém já preparado, moldado pela experiência. Como tal, o desafio fulcral de qualquer filme de terror é ultrapassar a barreira da ficção e aproximar-se à realidade.

Neste projecto, Meyers começa por ser uma criança calada, revoltada pouco a pouco com o ambiente familiar (a severidade do namorado da mãe e a “promíscuidade” da sua irmã mais velha), o espaço escolar (onde é gozado e atacado pelos rufias, seus colegas) e o todo o espaço que vagueia. Vive com uma vergonha silenciosa de ter uma stripper como mãe (uma participação simbólica de Sheri Moon Zombie, esposa de Rob Zombie, e protagonista dos seus anteriores filmes, embora seja nela que alcance algum ninho sentimental. A sua irmã mais nova (Laurie) é ainda uma bebé, e ele cuidará dela com um cuidado que nos surpreenderá. Perante este contexto, Meyers desde criança que prefere ocultar-se do detrás de máscaras, desta vez a de um palhaço, numa referência assumida de Zombie aos seus dos projectos cinematográficos anteriores.

A sua primeira apresentação não ilude na imagem de um jovem doce e sofredor, mas representa uma aproximação ao dia à dia de muitas familias americanas, e a diversas histórias de crimes macabros que povoam os mitos de muitas cidades do seu interior. O crime inicial que todos esperam deixa de se tornar “a primeira morte” para ser um aspecto que catalizará todo o evoluir do enredo. A representação do período em que se manteve internado, também serve para constituir a personagem de Meyers para a imagem que todos se recordam: silencioso, brutal e imparável.

Mais do que qualquer interpretação dos actores, este “remake” sobrevive à maldição das sequelas de “Halloween” pelo imenso respeito que Rob Zombie tem pelo material original. Não pretendeu copiar os mesmo conceitos, contudo também não quis mutilar um filme de culto do cinema de terror. Talvez seja mais do mesmo para alguns, e talvez isso prejudique a sua significância individual, porém existem períodos em que ver algo do mesmo, desde que seja bem construído, é um dislumbre para o olhar, e um arrepio para a espinha.

 

Bom
3 estrelas

 
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publicado por Nuno Cargaleiro às 20:42
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Março 30 2008

 

Se me permitem, numa primeira análise, considero preferível o titulo original deste filme (“Lust, Caution”) para representar o conceito do enredo, do que a adaptação portuguesa “Sedução, Conspiração”. Embora seja disso que o argumento trata, o impacto final reduz-se à relação de amor ódio provocada pelos protagonistas Tony Leung e Wei Tang, esta última numa estreia absolutamente fascinante.

Com “Sedução, Conspiração”, Ang Lee volta a remeter-nos para a sua visão romântica, onde a tragédia, amor e desejo andam de mãos dadas, num desenrolar com implicações imprevisíveis, e aspirando atingir a emoção do espectador.

O argumento começa durante a Segunda Guerra Mundial, num período onde a China sofria a ocupação crescente do Japão. A população migrava para localidades onde a invasão não tinha chegado, e o sentimento patriótico era dominante. É nesse momento em que encontramos Wong Chia Chi, uma jovem tímida, mas atenta, oscilante entre a sua posição actual e a mágoa e abandono do pai, emigrante no Reino Unido.

Num contacto universitário com um grupo de teatro, as suas capacidades de interpretação são aproveitadas, revelando nela uma capacidade de incorporação de personagem capaz de movimentar plateias. Através de uma peça nacionalista, o grupo de amigos é movido por um desejo ingénuo de ter um papel mais importante, imaginando um plano amador de infiltração e de homicídio de um “colaboracionista” dos japoneses, Mr. Yee. De todos os interveniente, é Wong Chia Chi que se torna capaz de suportar e encabeçar uma personagem fictícia, atingido a luxúria da vítima, que começa a observá-la com outros olhos.

Será nesta evolução de personagem que Ang Lee se concentra. Através da evolução entre as figuras de Wong Chia Chi (a figura real) e Mrs. Mak (a “espia” infiltrada) que todo o enredo avança, tomando essa personagem como massa motora de toda a acção. Todos os restantes, inclusive Mr. Yee, são secundários, sendo somente desenvolvidos o suficiente para complementar a história de Wong Chia Chi.

Mais do que uma personagem, Wong Chia Chi representa uma figura colectiva, metáfora de uma China activista, porém ligada às suas raízes morais e sentido moderno e romântico. Apesar de se tratar uma adaptação, nota-se um cunho pessoal do realizador, deixando perceber a dedicação e orgulho que este projecto lhe trouxe. Vencedor do Leão de Ouro de Veneza deste último ano, “Sedução, Conspiração” cuida com bastante atenção cada plano como uma representação física e emocional dum período conturbado da história daquele país, através de um conto entre o “desejo” entre duas personagens de extractos opostos, quer psicologicamente, socialmente, ou politicamente.

Nesse aspecto, terá sido um risco depositar toda esta importância numa actriz desconhecida, Weit Tang. Contudo, a aposta sagrando-se vencedora, embora o mérito também se deva ao contraponto provocado pelos acompanhantes: Lee-Hom Wang (como Kuang Yu Min, o seu “mentor” político e paixão platónica), Tony Leung (como Mr. Yee, o seu objecto e objectivo final), e Joan Chen (como sua antagonista feminina, numa interpretação deslumbrante que só não suplanta a da protagonista).

Contundo, a maior fragilidade deste projecto passa pela atenção esforçada do realizador. Dedicado a proporcionar uma fidelidade ao produto e temática original, Ang Lee tende a perder-se nos períodos iniciais. Embora a temática relacional seja das suas capacidades, enredos orientados para questões políticas e espionagem não serão dos seus pontos fortes. “Sedução, Conspiração” só começa a ganhar força a metade, e tendo em consideração que se trata de um total de duas horas e meia, Ang Lee arrisca-se perante os olhares mais imediatos.

Para os palatos mais pacientes, “Sedução, Conspiração” será um dos prazeres deste ano e uma confirmação de Ang Lee como realizador, numa intenção claramente positiva. Contudo, aqueles que vêem uma sessão como um escape para a rotina do dia à dia, será um tempo que causará um mau impacto, num desconforto que pode oscilar entre o entediante e arrependimento.

 

Bom

4 estrelas

 

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publicado por Nuno Cargaleiro às 04:08
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Fevereiro 15 2008


Inicialmente desconfiei do conceito que Mike Nichols pretendia explorar no seu novo filme. Depois de filmes como “Closer”, a ideia de que este realizador pretendia explorar um argumento associado ao um ambiente “pré-guerra do golfo” e assolado pelo fantasma do 11 de Setembro pareceu-me um pouco dissonante. Apesar do elenco “Oscarizado”, nas mãos de Tom Hanks, Julia Roberts e Philip Seymour Hoffman, a verdade é que não nutri uma grande simpatia ou interesse pelo seu desenvolvimento.

Dessa forma, é com relativa surpresa que verifiquei que estava enganado. Mike Nichols continua a apresentar-nos projectos complexos (embora aparentemente simples), consistentes, sem descuidar o produto final. Este filme é um exemplo disso. Nele, Tom Hanks encarna a pele de Charlie Wilson, um congressista do Estados Unidos, que aparentemente isolado, conseguirá interferir nas relações internacionais entre países do Médio Oriente, e modificar a tendência verificada no confronto existente, na altura, entre o Afeganistão e a antiga União Soviética. Com esta interferência “secreta”, através do fornecimento de armas específicas para contrapor os tanques e ataques aéreos do inimigo, fragilizou a antiga URSS, causando condições que levaram à queda do muro de Berlim e à queda do comunismo. Da mesma forma, catalizou o surgimento de grupos muçulmanos fanáticos e separatistas, que aproveitaram os meios e a formação militar de elite que os Estados Unidos lhe forneceram, que numa sucessão de acontecimentos, culminou no ataque às Torres Gémeas, a 11 de Setembro de 2001.

Porém, “Jogos de Poder” discute estes acontecimentos num tom ligeiro de comédia, onde o dinamizador de tudo, Charlie Wilson, é apresentado como um homem imperfeito, perpetuamente acompanhado por belas donzelas que o assistem nos assuntos de estado, com gosto por uma bela bebida e festarolas. Ao mesmo tempo, será uma das figuras mais inteligentes no meio político em que é retratado, movendo-se por entre esquemas de conhecimentos e favores fornecidos, tal uma velha raposa que não se deixa capturar. O humor de “Jogos de Poder” vive através destas contradições, como a figura de Joanne Herring (Julia Roberts), a sexta mulher mais rica do estado de Texas, que apesar de todo o conforto, luxo e crença católica, se envolve na luta para libertação do Afeganistão, ou do agente da CIA desempenhado por Philip Seymour Hoffman, que divide a sua imagem entre o espião bruto, para o elemento mais consciente e realista da equipa “clandestina” que trabalhou ao lado de Charlie Wilson. Nesse sentido, apesar do filme ser baseado em factos verídicos, Mike Nichols consegue demonstrar-nos subtilmente todo o ridículo e perigo desta situação. Quando conhecimentos de interesse, capital de investimento, e informação privilegiada se juntam, à margem de qualquer governo, conseguem de facto alterar as relações internacionais actuais. Será nesse conceito de fragilidade que Mike Nichols consegue dar o seu pequeno toque de mestre, numa das cenas mais memoráveis do filme, onde Charlie Wilson (Tom Hanks) ouve, com eventual descontracção, os avisos de Gust Avrakotos (Philip Seymour Hoffman), ao mesmo tempo que num som invisível, todo o fantasma do cenário pós 11 de Setembro é relembrado ao espectador.

Para além disso, “Jogos de Poder” tem outra vantagem a seu favor, ao não se levar demasiado a sério. Toda a equipa técnica é competente, o elenco é coerente (com especial destaque para Philip Seymor Hoffman e Tom Hanks, possivelmente no seu primeiro nú em cinema), e a destreza de Mike Nichols, ao transformar um assunto real em produto de entretenimento e reflexão, conseguem amparar este projecto a melhores avaliações.

“Jogos de Poder” não será um filme memorável sobre guerra ou política, mas um projecto interessante sobre o ser humano integrado no mundo. Num discurso bem disposto e humorado, com um conflito contemporâneo como pano de fundo, demonstram-nos que a responsabilidade, consciência e interesses internacionais não se encontram necessariamente relacionados.

7/10

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publicado por Nuno Cargaleiro às 16:38

Novembro 10 2007

 

 

Nito!...

 

Falar sobre "A Outra Margem" é um prazer (algo) inesperado. No trailer já se sentia o cuidado, e o prenúncio de algo de bom que se aproximava. Contudo, é no visionamento que se percebe o quão bem o rumo do cinema português pode tomar, caso o espectador dê simplesmente oportunidade dele se manifestar.

 

Dotado de uma simplicidade genuina, sem cair no esteriótipo e na superficialidade fácil, este filme apresenta-nos uma história curiosa sobre dor, perda e descoberta da paixão de viver através dos olhos de figuras que parecem tão estranhas para os olhares comuns, cruzando com personagens que são representações positivas do homem e da mulher rural do dia à dia.

 

Quando um homem que deixou o passado, e a família para trás, vê-se numa situação de dor e perda do amor da sua vida, acaba por ser convidado a recuperar num ambiente que não esperava cruzar: a sua terra natal. Por entre abalos e recusas, pouco a pouco regressa às origens, no contacto daqueles que deixou (e "magoou"), e através de uma figura que nunca conheceu, o seu sobrinho, um jovem com sindrome de Down, que apesar das suas "limitações" não deixa de demonstrar a maior força de vida, e os sonhos mais fortes e determinados.

 

Regressar às origens para curar as dores do presente não é conceito novo. Porém, "A Outra Margem" vale pela representação fiel de cada uma das personagens. Entre cenários e personagens "à la Almodóvar" cruzam-se representações do interior rural português, onde as pessoas parecem mais duras, mas não menos sentimentais e tolerantes do que os restantes.

 

Os diálogos são inteligentes, e os silêncios têm o tempo certo, mostrando-nos numa "janela", que é o grande ecrã, um relato do quotidiano feito "conto de fadas".

 

Nesta história a fada madrinha é "Vanessa Blue", uma imagem feminina de glamour e alegria que conduz o pinóquio que é Vasco, o jovem com sindrome de Down, no caminho da luz e do sonho, ao mesmo tempo que este também representa o cavaleiro andante de "bicicleta branca" que salva Ricardo (a verdeira face de Vanessa Blue) do seu sono de dor e mágoa.

 

Com este projecto, Luis Filipe Rocha arrisca-se de cada vez mais ser considerado um optimo director de actores. Do núcleo forte não há nenhum dedo a apontar, somente a pena que reside no espectador sobre a pequena tragédia que cada um traz dentro de si. Quando todos perdem alguma coisa (ou alguém) nesta vida, resta olhar em frente e deixar as cinzas do que nos consome serem levadas pelo vento.

 

Um dos melhores filmes dos últimos tempos, onde conceitos como previsibilidade e preconceito são desmacarados em privilégio de familia, amor, amizade, família e emoção.

 

Muito Bom

4 Estrelas

publicado por Nuno Cargaleiro às 01:43
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Outubro 25 2007

 

 

 La Bastille

 

Il pleut des cordes sur le genie
de la place de la Bastille
nous marchons sous un ciel gris
Perce par des milliers d'aiguilles
Il pleut des cordes sur le genie
les nuages trop lourds s'abandonnent
de l'eau pour les gens de Paris
pour l'ange nu sur la colonne

a l'horizon de nos fenetres
plus rien ne bouge plus rien ne vit
comme paris semble disparaitre
dilue dans de l'eau de pluie
a l'horizon le ciel defait
l'ange ruisselant se dessine
on voudrait s'aimer a jamais
sous cette pluie que rien ne termine

Il pleut encore sur le genie
de la place de la Bastille
boire du the tout l'apres-midi
de ces dimanches de camomille
il pleut des cordes sur le genie
qui aurait cru que si peu d'eau
ferait fuir les gens de Paris
laissant l'ange trop seul et trop haut

a l'horizon de nos fenetres
plus rien ne bouge plus rien ne vit
comme Paris semble disparaitre
dilue dans de l'eau de pluie
a l'horizon le ciel defait
l'ange ruisselant se dessine
on voudrait s'aimer a jamais
sous cette pluie que rien ne termine
hum hu hu hum hu hu hum

Il pleut toujours sur le genie
de la place de la Bastille
nous nous couchons avant minuit
dans des draps chauds qu'on eparpille
il pleut toujours sur le genie
on sort des repas de famille
l'ange ruisselant dans la nuit
deploie ses ailes sur la Bastille

 

 A palavra cantada desnuda-se sincera e honesta neste filme. Muito mais do que algum dos filmes que vi nos últimos tempos "As Canções de Amor" de Cristophe Honoré representam a dor, humor, amizade e amor do quotidiano, onde as faces vivem entre si, numa estranha harmonia motivada por um certo anjo da Bastilha, em forma de anjo de mudança, num misto de desgraça e vida.

 

A escolha da letra de "La Bastille" para ilustrar o início desta crítica não foi por acaso. Entre o relato do abandono de gente das ruas de Paris por causa da chuva existe um definição do próprio projecto. Talvez por ser cantado por uma "família", talvez porque antecipa o inesperado, ou talvez porque define o espaço de toda a acção. A chuva também acaba por "lavar" o passado, e sobretudo, na minha visão, é sobre isto que o filme fala numa experiência sensorial para o ouvido mais enferrujado: as canções de amor têm um tempo, mas nunca deixam de ser o que foram.

 

À primeira vista, este filme pode causar alguma resistência, quer por ser cinema francês, quer por ser um musical. Contudo, só me fez querer conhecer mais deste realizador, cujos anteriores projectos tive contacto, mas nunca cheguei a conhecer a fundo. Nunca vi "Ma Mére" nem o tão elogiado "Dans Paris", e devo dizer agora que para muita pena minha!

 

Cristophe Honoré revela-se como um director atento e criativo, onde o discurso atinge quem tem simplesmente a predisposição de ouvir. O argumento de "Les Chansons D'Amour" é prova viva disso. Desde o primeiro trailer, até ao primeiro minuto do filme, Honoré articula-nos numa mestria cuidada, procurando diminuir as nossas defesas para aquilo que nos espera. E após isso tudo, desnudamo-nos perante tanta honestidade e vida que acabamos por seguir as linhas cantadas das personagens como se quisessemos nós cantar alguns dos momentos da nossa vida. 

 

Os actores são competentes, com especial atenção ao triângulo original: Louis Garrel, Ludivine Sagnier e Clotilde Hesme. Chiara Mastroianni, Grégoire Leprince-Ringuet e Brigitte Roüan também se evidenciam, embora de um modo ligeiro quando comparado com a intensidade dos primeiros. As suas interpretações musicais são sentidas ao mais pequeno diálogo, com especial enfoque para o "Si tard" de Ludivine Sagnier, numa das cenas mais emotivas do filme.

 

Sobre o enredo, hão de reparar que nenhum bloguista o desvenda por completo. Esse conceito é uma das almas do projecto. Num retrato sobre o quotidiano, num espaço citadino, o inesperado vive a cada esquina e a cada pessoa com que se cruza. A moral da história deixa de existir e cada um define a sua vida. As pessoas são pessoas e demarcam-se por si, conquistando o seu espaço, e dando-se ao outro. O amor vive nas ruas de Paris para quem quiser encontrar, pretender receber, abraçar e quiser cantar "Amo-te".

 

Um filme onde o riso se confunde com a emoção, e a honestidade de cada letra inspira cada espectador para a sua caminhada de regresso a casa.

 

Honestamente, para mim, uma das maiores surpresas deste ano, e com toda a certeza um dos melhores filmes desde há algum tempo.

 

Exclente

5 estrelas

 

 

 

 

publicado por Nuno Cargaleiro às 01:42
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Setembro 15 2007

 

 

Izzi: It's all done except the last chapter. I want you to help me. Finish it...

 

"The Fountain" é um filme "comercial" feito obra de arte visual de "autor". Dotado de uma capacidade encantar o espectador, pode contudo, apanhar desprevenido o mais incauto.

 

Embora o início possa parecer um pouco confuso, com o desenrolar do enredo constatamos a absoluta entrega do realizador e da sua equipa, actores incluídos, na representação da questão eterna da "imortalidade".

 

Mais do que isso, este projecto fala sobretudo de amor, aceitação, renovação e do equilíbrio existente entre a vida e a morte.

 

Um dos maiores "defeitos" deste projecto é sobretudo o caracter comercial que levou, a partir do trailer, à construção de uma perspectiva diferente do produto final... pelos menos na minha opinião, caso este filme tive sido lançado inicialmente como um "trabalho alternativo" poderia ter opiniões mais favoráveis do que aconteceu no momento do seu lançamento.

 

Rachel Weisz é Izzi, esposa de Tom (Hugh Jackman), vítima de uma doença terminal que rapidamente se desenvolve, sem perspectivas de cura ou tratamento possível. Por outro lado, o seu marido, sente constantemente em si a dúvida do desperdício de tempo afastado da sua esposa, constratando com a iniciativa de encontrar uma solução terapeutica oculta que premita prolongar, ou solucionar a fatalidade da sua mulher.

 

Ela, escritora, sentido a divisão emocional do seu marido, acaba por construir um livro sobre um explorador espanhol, que por amor e dedicação à sua Rainha, desencadeia uma obsessiva busca pela fonte da juventude pelo Novo Continente. Contudo, antes de sentir as suas forças a esvairem-se, entrega, num presente caridoso, esse projecto para o esposo terminar, escrevendo ele o último de capítulo dessa história.

 

É nesse ritmo que "The Fountain" se divide: entre o passado fictício, o presente amargo, e o futuro de uma possibilidade emocional interna de Tom.

 

Mais do que falar sobre a vida eterna, este filme apresenta-nos uma discussão sobre a vida do dia à dia, centrando-se na imagem daqueles que "ficam", e no significado que o percurso de cada um toma a quando de uma perda próxima. Apesar de levantar uma filosofia própria, o filme permite cada um espectador retirar dele o que pretende, num misto de tranquilidade, emoção e compaixão.

 

Um projecto para além do primeiro olhar dos seus espectadores, com interpretações de destaque de Rachel Weisz e a fabulosa Ellen Berstyn, e um conceito onde os efeitos visuais servem por absoluto o seu enredo.

 

Muito Bom

4 Estrelas

 

 

publicado por Nuno Cargaleiro às 02:14
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Julho 28 2007

 

 

 Homer Simpson: Did I save the day?

Bart Simpson: Actually, you've doomed us all!

Homer Simpson: D'OH!

 

A muito esperada passagem dos Simpsons para o grande ecrã funde-se num misto de estranheza e delírio... Que é certo que não descuida da tecnica muito treinada ao longo de 19 anos, a verdade é que não acrescenta nada de novo. "Bigger Longer & Uncut" era o subtítulo da adaptação cinematográfica de "South Park", que parece também fadada à adaptação de "The Simpsons". Embora estejamos habituados a errendos algo "weird" e "non-sence" durante as várias séries, o certo é que o conceito deste filme parece fruto de uma tentativa de jogar pelo seguro, estimulando a renovação para novas séries, e apalpando o terreno para uma "história que o público pode ver gratuitamente em casa"...

 

O mais curioso neste facto passa pela produção assumir, indirectamente, esta situação, e na maior parte das vezes gozar consigo mesma, e com todo o programa, numa jogada inteligente de "fair play" e de sentido de oportunidade.

 

Para aqueles que esperam um "episódio longo" de "The Simpsons", estão um pouco desenquadrados. A série, como estamos habituados, não está representada nos vários aspectos do dia à dia, desperdiçando personagens como o Director Skinner ou o pérfido Mr. Burns para personagens secundárias, quase cameos. Este filme gira principalmente na família amarela que se habituou em aperecer nos nossos televisores, embora seja Homer que ganhe especial destaque...

 

Quanto à história, apesar de todos os twists, é simples: Homer faz merda, Homer foge, Homer tem que concertar o seu erro. No meio disto, vemos a representação de uma família que corre risco iminente de se desmembrar, e verificamos que as histórias secundárias de Bart e de Lisa se perdem no decurso deste argumento, adivinhando que serão desenvolvidas posteriormente nos novos episódios da série televisiva.

 

O grande trunfo de "The Simpsons Movie", apesar destes "defeitos", é não se levar a sério, e como tal, servir como uma forma de entretenimento para qualquer espectador... Até o surgimento do fabuloso "Spider Pig" é um momento de humor muito bem conseguido.

 

Ao sair do cinema, o espectador não se sente defraudado, pois de facto riu do início até ao fim (e quando digo fim, é MESMO até ao último momento da ficha técnica). Contudo o fã mais entusiasmado não deixa de sentir um toque de maior expectativa, ansiado que o próximo capítulo (porque de certeza existirá uma sequela), onde tudo pareça menos "weird" e mais "yellow".

 

Apesar destes reparos, não posso deixar de reconhecer-lhe o valor como produto isolado, e como bom momento de entretenimento... Contudo, verificando-se a mesma situação num novo projecto, o mais certo é que o público (e comigo incluido) não seja tão benevolente.

 

Muito Bom

4 Estrelas

 

 

 

 

publicado por Nuno Cargaleiro às 23:50
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Julho 27 2007

 

 

 

"A Rapariga Morta" é uma experiência interessante sobre o impacto que um acontecimento pode ter na vida de outros, determinando por vezes, situações que geram mudança, e apresentam um melhor rumo para esta personagem. Como se a natureza vivesse num equilíbrio, onde a desgraça de um pode perspectivar, indirectamente, a felicidade de outros, ou pelo menos uma consciência diferente do mundo que os rodeia, compensando o mundo da perda de mais um elemento.

 

Dotado de um elenco feminino fabuloso, é sobretudo a imagem de Rose Byrne, Piper Laurie, Marcia Gay Harden, Kerry Washington, e Mary Beth Hurt (que faz transparecer a sua personagem numa nudez incomodativa) que sobressaem do núcleo que oscila entre o morno e o apaixonante. Especial menção para Brittany Murphy, que consegue destoar da imagem que tem passado nos seus últimos filmes, modificando inclusive a voz para um tom mais grave, a fim de se entregar a uma personagem que deve ter sido das maiores prendas que recebeu nos últimos tempos!...

 

Ao contrário de muitas películas de múltiplos enredos, "A Rapariga Morta" apresenta as suas histórias separadamente, como se fossem um conjunto de curtas metragens centradas num único tema: a morte por homicídio (brutal) de uma rapariga. A despersonalização do cadáver acaba por causar impacto na vida de mulheres que aperentemente não se sentiriam ligadas por esta figura quando esta estaria viva: uma adulta "estranha" feita adolescente dominada pelo espírito castrador da sua mãe, a "eterna" irmã de uma criança desaparecida, a esposa queixosa que confronta-se com a felicidade do seu casamento, e uma mãe que se questiona o quanto conhecia a sua filha!...

 

Apesar desta separação de enredos permitir uma maior concentração por parte do espectador, também revela os maiores defeitos do argumento. Verificamos momentos, como a história inicial, a cargo de Toni Collette, que se tornam desinteressantes, em contraste com os segmentos da "irmã" e da "esposa", onde sentimos que muita história ficou por contar. Talvez se a organização fosse outra, apresentando os diversos núcleos de um modo cruzado, esta sensação fosse atenuada. Contudo, esta situação não retira valor ao filme, simplesmente não atribui a qualidade que seria desejada.

 

Uma história de mulheres, onde a imagem de "uma rapariga morta" confronta-as com a sua mortalidade e resignação quanto ao seu quotidiano, como se um benefício fosse, num acaso do destino que tira de uma mão para apresentar rumos a outros que ainda têm oportunidade em terem oportunidades...

 

Bom

3 Estrelas

 

publicado por Nuno Cargaleiro às 01:00
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Julho 24 2007

 

 

Stuntman Mike: Ladies, we're gonna have some fun.

 

Antes de comentar o meu primeiro gosto da experiência "Grindhouse", devo admitir que o projecto de Tarantino não seria aquele em que teria mais expectativas. O conceito inicial de um "serial killer" que ataca jovens raparigas "indefesas" munido de um carro "à prova de morte" não me parecia aliciante o suficiente para despertar o meu interesse. Paralelamente a isso, os comentários de Tarantino, admitindo que neste filme teria escrito dos melhores diálogos da sua carreira parecia-me mais "fogo de vista", num marketing a roçar o desespero... Como eu estava enganado!...

 

Tarantino consegue em "Death Proof" apresentar-nos um projecto diferente, e com uma capacidade de envolvimento do espectador, de um modo tão inesperado, que certas cenas são como um murro directo no estomâgo, criando pena, gozo, alegria, e raiva... Nunca tive uma experiência numa sala de cinema onde me apetecesse gritar em plenos pulmões, como se falasse com as personagens femininas, incentivando-as a retaliar contra aquele homem tão perigoso como patético... É certo que terá sido a minha primeira experiência, mas isto é de facto o que esperava por "uma sessão Grindhouse"!

 

O mais divertido de Tarantino é a sua cultura cinematográfica, denotada em várias referências a filmes específicos, e a estilos marginais que este projecto procura revitalizar. Numa "reciclagem" que nunca recusa as suas características principais, vemo-nos a ver um filme que poderia ter sido filmado nos anos 70, início dos anos 80, mas num contexto actual, cheio de telemóveis e carros modernos, que contrastam com o estilo "cool" de pequenas preciosidades, como o Chevy Nova de 1970 ou o Dodge Charger de 1969 que "Stuntman Mike" conduz...

 

Um dos grandes trunfos, como Tarantino já nos habituou, é a sua banda sonora, que ora num toque carregado, ora algo melodico, enaltecem todo o ambiente da cena que presenciamos...

 

Mas realmente o maior trunfo desta película são as suas protagonistas... Ser mulher e é entrar num filme de Tarantino é quase equivalente do que entrar num projecto de Almodóvar!... Embora Tarantino goste mais da imagem "sexy mamma", as suas actrizes têm uma densidade e diálogos que é raro de encontrar. Death Proof é um pleno exemplo disso. Nele surgem alguns grupos de amigas, que têm conversas naturais, honestas e abertas, aparentemente banais, mas que reproduzem a imagem de muitas mulheres que conhecemos. Curiosamente, Tarantino vai contra o esteriótipo e apresentam-nos um conjunto de heroínas inesperadas, muito para a nossa surpresa!...

 

Do grupo, as mais conhecidas, das quais se incluem Rosario Dawson, Rose McGowan e Mary Elizabeth Winstead, cumprem a sua função na trama, embora tenham um perfil mais "secundário" do que as restantes. Inesperadamente, são Vanessa Ferlito, Tracie Thoms, Zoe Bell e Sydney Tamiia Poitier que nos enchem as medidas, e que envolvem o espectador num frenesim partilhado, em busca de uma solução que salve as moçoilas de morte certa.

 

Quanto a Kurt Russell, há muito tempo que não o viamos em tão boa forma, e tão disposto a gozar com a sua imagem, num personagem que faz lembrar um Snake Plissken ("Fuga de Nova Iorque") em tons de negativo... Russell é competente, e apesar de notarmos que leva a sério esta oportunidade, certo é que não se leva demasiado a sério, fundindo-se no projecto, e contribuindo para resultado final positivo.

 

"Death Proof" é um bom exemplo da competência de Tarantino, que de planos e montagens aparentemente descuidadas consegue conferir coerência num projecto que é mais do que um modo de entretenimento, é uma experiência viva que nos estimula, numa expectativa de que "Grindhouse" ainda "tenha bastantes cartuchos" para o futuro!...

 

 

Excelente

5 Estrelas

 

 

 

publicado por Nuno Cargaleiro às 21:50
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